Preservação
dos Espaços de Memória
Desde as primeiras
experiências de preservação de espaços públicos ou privados, essas ações foram
muito bem aceitas e demonstraram grande importância social, especialmente para
o bem-estar de moradores de áreas densamente povoadas. A partir de determinado
período da História, as ações de resgate de edificações, ou até de grandes
áreas, tornaram-se vinculadores e suportes de ações sociais de interação
entre os habitantes e sua cidade.
Não apenas regiões
deterioradas pelo seu abandono como habitat, mas também símbolos e signos da
ocupação territorial vêm sendo respeitados e conservados, não só como fontes de
pesquisas, mas, e principalmente, para serem adequados e oferecidos como novo
local de convivência e interação.
Ações que preservam
pontos de referência da memória urbana despertam interesse dos poderes públicos,
depois que estudiosos, arquitetos, historiadores e outros pesquisadores sociais
demonstraram a valiosa relação que o cidadão mantém com os locais que fazem
parte de seu entorno. O habitante torna sua a paisagem de seu percurso
cotidiano e se interessa, de modo algumas vezes apenas subliminar, pela
permanência desse entorno. E naturalmente sente quando as mudanças dessa
paisagem são caóticas e inadequadas. Locais que os cidadãos sabem não lhes pertencer
pela posse nominal registrada, mas que por frequentá-los - ter deles alguma
referência – intuem que lhes diz respeito. Tomam posse deles algumas vezes
porque são cenários de sua vida; são cenários palpáveis de fatos
anteriores que lhes oferecem algum aconchego histórico, nicho de raízes
comuns, nem sempre heroica ou reconhecida nos compêndios de História, mas
importantes para grupos e indivíduos como atores nem sempre reconhecidos
de seu tempo.
Hoje felizmente sabe-se
e se respeita cada vez mais a paisagem urbana, porque já se entende que
ela pertence ao habitante da cidade. O contribuinte, como é classificado nas
frias anotações das secretarias de Estado, vai se tornando alguém a quem se
devem satisfações pelas interferências nessa mesma paisagem. E essas são apenas
algumas das razões do por que são sempre bem-vindas ações de preservação do
patrimônio edificado ou mesmo de espaços de convivência como parques, praças,
trechos de ruas e avenidas etc.
E assim no século XX,
em vários pontos do planeta, a preservação ganhou adeptos não só entre poetas
saudosistas, historiadores voltados aos grandes feitos que mudaram os rumos de
um universo particular ou arqueólogos e estudiosos de arquitetura, mas também
entre a população que, durante migrações forçadas ou não, buscam referências
que lhes integre ao espaço que compartilham entre si.
Partilhar o espaço onde
ocorreram eventos históricos ou apenas partilhar espaços onde se desenrolaram
fatos cotidianos e amigáveis equivalem-se. São paisagens de memória e sua
importância reside não só em sua utilização, mas no conjunto de fatores que
lhes dão sentido.
Por outro lado, há o
fenômeno pós-moderno, ilustrado pela proliferação de brechós, feiras de
antiguidades, coleções etc. Objetos de uso cotidiano – nem tão antigos - tornados obsoletos, desnecessários perante novas propostas, novos
comportamentos e ações, já não são descartados com tanta facilidade, já não são
relegados ao baú dos porões ou ao descarte puro e simples dos desmanches ou da
reciclagem. Cada cidadão agora deseja ficar com um pouco de sua trajetória, ou
seja, da trajetória de vida de seus antepassados ou antecessores, por meio de
objetos-relatos. É o paradoxo de um período classificado como
pós-moderno (embora esse termo seja contestado). Há a vontade extrema do
consumo da última novidade ao lado da mais antiga peça, que anos atrás estaria
reservada a museus, pouco frequentados ou esquecidos.
O crescente interesse
por edificações antigas ou relevantes chega a transformar cidades inteiras em
sítios preservados, que sensibilizam pessoas de outros lugares, turistas
visitantes, e provocam nos próprios habitantes orgulho e respeito. Fotografar
com um simples celular, em plataformas midiáticas de última geração um local,
um objeto, um edifício que traz em si a feitura, os materiais e as intenções de
séculos anteriores é tão sedutor como o último modelo de consumo. Mas há de se ter cuidado, pois modismos passam com facilidade e se
esses signos ou símbolos não estiverem ligados a sua esfera de conceitos e
ações determinantes serão apenas imagens sem valor, facilmente descartadas.
Cabem aos estudiosos, pesquisadores, filósofos, antropólogos, historiadores e
cientistas sociais reunir e aclarar as relações que dão sentido a esses signos.
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